Jornal Nacional noticia crise hídrica sem mencionar Alckmin
William Boinamerd (seu nome de batismo, com 'd' mudo) é editor do JotahieNa
Do Viomundo
O governo Alckmin
finalmente reconheceu, de forma
oficial, a crise hídrica.
Mas, para o Jornal Nacional da
sexta-feira, tudo se deve ao clima. A repórter, em tom de
frustração, diz que há nuvens no céu, mas não cai chuva.
Não
há questionamento à falta de planejamento, nem mesmo das obras de emergência.
Pelo contrário. Logo de cara, diz a apresentadora:
Os moradores da Grande
São Paulo estão vivendo com quase 30% a menos de água do que no ano passado. A
falta de chuva está prejudicando até mesmo as obras de emergência para
enfrentar a seca.
Notem,
na sequencia, o que diz a repórter sobre uma das obras de emergência:
É o caso da transposição
do Rio Guaió, que teria capacidade para mandar mil litros por segundo para o
sistema de abastecimento. Mas com a estiagem estão chegando apenas 350 litros.
Obra contra seca que também precisa de chuva.
“Obra contra seca que
também precisa de chuva” parece piada de português. Mas o JN disse isso em tom
sério e não informou que ela custou R$ 29 milhões de reais.
Teria sido mais honesto
fazer o que fez a Rede Brasil Atual: “Sabesp faz
obra milionária para retirar água de rio que está seco”.
Na reportagem do Jornal Nacional, o
presidente da Sabesp apareceu duas vezes para vender seu peixe.
Não
há contraponto à palavra oficial.
Aparentemente, os
produtores do JN vivem
na ilha da fantasia — ou vai ver que os irmãos Marinho já estão engajados na
chapa Alckmin 2018.
Se
precisam de algumas dicas, bom proveito:
“A Sabesp retirou muito
mais [água] do que deveria [do Sistema Cantereira], adotando cenários
otimistas, irreais. A questão todinha é essa: a Sabesp não se preparou para o
pior e ficou esperando pelo melhor”. Jose
Roberto Kachel, engenheiro civil e sanitarista, ex-funcionário da Sabesp
“Se nós tivéssemos
padrões de retirada do sistema Cantareira de 2015 já em 2014. Ou seja, se
houvesse preparação para a crise, nós teríamos água nos reservatórios para,
mesmo num período de 2015 e 2016, teríamos condições de garantia hídrico até
2017. Porém, o retardamento na tomada de decisão obviamente levou a uma gestão,
na minha opinião, bastante ineficiente”.
Apesar de todos os
problemas repassados à população e a falta de obras concluídas a tempo de
tentar reduzir os prejuízos aos paulistas, a Sabesp teve lucro líquido de R$
337,3 milhões entre abril e junho deste ano. O valor é 11,5% maior que os
R$ 302 milhões verificados no mesmo período de 2014. Apesar de não solucionar o
problema da falta d’água, boa parte do faturamento da empresa foi alcançado por
meio de dois aumentos de tarifa. Um de 6,5%, em dezembro de 2014, e um de
15,4%, em junho. A falta de recursos também não é justificativa para o
baixo retorno à população. Nos últimos sete anos, os acionistas da companhia
receberam R$ 3,4 bilhões em dividendos, enquanto nada ou quase nada foi
investido em obras de recuperação de mananciais. Recente relatório do Tribunal
de Contas o Estado de São Paulo (TCE) aponta os governos de São Paulo, desde
2004, como os responsáveis pela crise hídrica. Por lei, a empresa é obrigada a
repassar 25% dos lucros aos investidores, mas a Sabesp repassou 48% a mais que
o mínimo legal.
O colapso do
abastecimento de água que atinge a região metropolitana de São Paulo e várias
cidades do estado não pode ser atribuído –como vocifera o governo estadual–
apenas à estiagem atípica e mudanças climáticas que afetam São Paulo. É
fruto, sobretudo, da irresponsabilidade e improbidade administrativa, da falta
de gestão e planejamento e da incúria do (des) governo tucano, que há mais de
dez anos foi alertado sobre o esgotamento do modelo hídrico, como também
nenhuma medida tomou a fim de oferecer o mínimo de segurança hídrica à
população. Em 2004, quando da outorga do Cantareira, a Sabesp teria que,
no prazo de três meses, apresentar uma proposta de construção de novos
reservatórios e captação de águas em outros mananciais. Estava no contrato. Porém,
as obras não foram realizadas e nem cobradas pelo governo. Em 2009 a Secretaria
Estadual do Meio Ambiente realizou o estudo Cenários Ambientais 2020 com a
colaboração de 200 especialistas em que previu com dados científicos a crise de
2015 e outra em 2018. Esses são dois dos muitos alertas feitos sobre os
desafios do abastecimento de água para os paulistas. As gestões do PSDB
–partido que (des) governa o Estado de São Paulo há 20 anos– transformaram a
água em mercadoria através da conversão da Sabesp numa empresa preocupada
apenas em vender água e obter altos lucros, sobretudo para entregá-los aos
especuladores da bolsa de Nova York.
A grande mídia teve comportamento parcial o tempo todo. Ela teve a clara
preocupação de poupar o governador. No noticiário,a falta de água era
atribuída somente à estiagem. Toda vez que uma matéria falava em falta de água,
ela vinha a previsão do tempo junto. Ou seja, uma maneira de relacionar
uma coisa à outra e não deixar espaço para questionamento. Tudo era efeito do
clima. Não havia a preocupação em mostrar que a crise hídrica decorria da falta
de planejamento do governador e de seu antecessor, José Serra.
Pelo
jeito, nem o possível agravamento da crise nos próximos meses vai mudar isso.
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