Não dá para confiar na famiglia Marinho
Por Altamiro Borges
A famiglia Marinho, que utilizou todos os veículos que compõe a sua propriedade
cruzada na mídia para desgastar o governo Dilma e para insuflar as marchas
golpistas de março e abril, parece que desembarcou da aventura dos que propõem
o impeachment da presidenta. Em editorial nesta sexta-feira (7), a jornal O
Globo criticou o oportunismo do presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha, e
a “marcha da insensatez” da oposição. Também circula a informação de que um dos
chefões da corporação, João Roberto Marinho, teria se reunido com nove dos 13
senadores do PT para defender “que Dilma seja sucedida por quem ganhar as
eleições de 2018. Ou seja, impeachment, não”.
No editorial, intitulado “Manipulação do Congresso ultrapassa
limites”, o jornalão anuncia o seu rompimento com Eduardo Cunha, a quem sempre
protegeu. “Ele age de forma assumida como oposição ao governo Dilma na
tentativa de demonstrar força para escapar de ser denunciado ao Supremo,
condenado e perder o mandato, por envolvimento nas traficâncias financeiras
desvendadas pela Lava-Jato. Daí, trabalhar pela aprovação de ‘pautas-bomba’,
destinadas a explodir o Orçamento e, em consequência, queira ou não,
desestabilizar de vez a própria economia brasileira... Se a conjuntura já é
muito ruim, a situação piora com o deputado manipulando com habilidade o
Legislativo na sua guerra particular contra Dilma e petistas. Equivale ao uso
de arma nuclear em briga de rua, e com a conivência de todos os partidos,
inclusive os da oposição”.
Ao final, a famiglia Marinho faz um apelo à paz: “É preciso entender que a
crise política, enquanto corrói a capacidade de governar do Planalto, turbina a
crise econômica, por degradar as expectativas e paralisar o Executivo. Dessa
forma, a nota de risco do Brasil irá mesmo para abaixo do ‘grau de
investimento’, com todas as implicações previsíveis: redução de investimentos
externos, diretos e para aplicações financeiras; portanto, maiores
desvalorizações cambiais, cujo resultado será novo choque de inflação. Logo, a
recessão tenderá a ser mais longa, bem como, em decorrência, o ciclo de
desemprego e queda de renda. Tudo isso deveria aproximar os políticos
responsáveis de todos os partidos para dar condições de governabilidade ao
Planalto”.
Se o editorial já havia surpreendido os que conhecem a história sinistra e
golpista da Globo, o texto postado por um “anônimo” do blog Diário do Centro do
Mundo gerou ainda maiores questionamentos sobre as movimentações recentes da
famiglia Marinho. Vale conferir:
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Dilma deve ser sucedida por quem ganhar em 2018, disse João Roberto
Marinho a senadores do PT
Postado em 8 de agosto de 2015
Por Anônimo
João Roberto Marinho pediu encontro com os senadores do PT, na última
quarta-feira.
Dos 13, nove aceitaram.
Durou quase duas horas. Ele abriu, dizendo-se muito preocupado com as
“maluquices” de Eduardo Cunha na Câmara, que não comprometem apenas o próximo
governo, mas o futuro do País;
Durante todo o tempo, escutou as queixas dos senadores, um por um, sobre a
parcialidade, os dois pesos, duas medidas, as abordagens dos repórteres
querendo declarações que apenas preencham a verdade que já está
pré-estabelecida, a repercussão nula do que os governos Lula e Dilma fizeram
pelo Brasil.
Recados que foram dados a ele: 1) não mexam com Lula – todos estavam ainda
muito mordidos com a charge do Chico [Caruso] do dia anterior (“agora só falta
você”), pois o Brasil pode pegar fogo e eles não vão ser bombeiros; 2) na mesma
direção, não temos controle sobre nossa base social e é imprevisível a reação
que se virá ante uma hipotética prisão de Lula.
Ele pediu desculpas, “ou os senhores estão enganados, ou nós estamos errando
feio”, comprometendo-se a levar a avaliação geral dos senadores para os
editores.
Disse ainda que, realmente, a cumplicidade entre jornalistas e procuradores de
Curitiba, hoje, representa um fator de instabilidade, mas jogou a culpa no PT,
“que deu início a essa parceria”. Ao final, pediu para o governo controlar sua
base na Câmara.
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Três hipóteses sobre o “recuo tático”
O que teria levado o poderoso império global a, aparentemente, abandonar a
“marcha da insensatez” dos golpistas e a rifar o lobista Eduardo Cunha? Há
pelos menos três hipóteses consistentes:
1- A crise política, insuflada pela oposição demotucana, os grupelhos fascistas
e a própria mídia privada, agravou o cenário econômico. Setores empresariais,
inclusive do ramo financeiro, temem pela deterioração dos seus negócios, dos
seus lucros. A aposta no impeachment e na instabilidade permanente poderia
contagiar ainda mais a economia. Em entrevista ao Jornal do Brasil, Delfim
Netto, ex-ministro da Fazenda da ditadura e influente interlocutor das elites,
já alertou que “esse impasse não pode continuar por muito tempo, porque quem
vai pagar um preço muito alto é a sociedade brasileira”. No mesmo rumo, o
presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, em entrevista à Folha, apontou que
“a crise política é mais forte que a econômica. Isso abala a confiança no país
e retarda a retomada do crescimento”. O Grupo Globo, que também sente os
impactos da crise econômica, estaria tentando evitar o descarrilamento.
2- A famiglia Marinho, que historicamente sempre incentivou golpes e apostou na
desestabilização de governos que não rezam da sua cartilha, teme que a crise
atual gere convulsões sociais, acirrando ainda mais a luta de classes no país.
Ela sabe que o Brasil não é o Paraguai ou Honduras, onde recentes golpes
judiciais-midiáticos obtiveram êxito. Nestes países, a esquerda social e
política era muito frágil. No Brasil, apesar das debilidades, as organizações
populares e os partidos de esquerda ainda têm força e representatividade. A
capacidade de reação é muito maior, o que tornaria infernal a adoção de um
impeachment. O império global pode até saber como orquestrar e iniciar um golpe,
mas não sabe como ele terminará. As consequências poderão ser trágicas, com
alguns dias valendo anos em termos de politização e mobilização da sociedade
contra as elites golpistas.
3- Por último, a famiglia Marinho não confia totalmente nas peças que estão em
jogo para suceder a presidenta num possível impeachment. Michel Temer, o
vice-presidente, tem telhado de vidro. Seu partido, o PMDB, é um dos principais
focos da midiática Operação Lava-Jato. No caso da impugnação da chapa que
venceu democraticamente as eleições do ano passado, quem assume é Eduardo
Cunha. A Rede Globo até tentou se apresentar como porta-voz do lobista,
escondendo sua história de achacador. Hoje, porém, parece que já rifou o
aventureiro. No campo da oposição demotucana, o império global sabe que não há
unidade entre os seus caciques. As bicadas são cada vez mais sangrentas no
ninho entre o cambaleante Aécio Neves, o calculista José Serra e o pragmático
Geraldo Alckmin. Uma nova eleição poderia ainda causar péssimas surpresas. “Se
Dilma renunciar ou se sofrer impeachment, Lula é quem mais ganhará”, alertou
nesta sexta-feira (7) a colunista Ruth de Aquino na revista Época, uma das
preferidas da famiglia Marinho.
Dinheiro, dinheiro e dinheiro
Há ainda outras hipóteses sobre o “recuo tático” do império global. O
jornalista Paulo Nogueira bate na tecla:
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A Globo não é exatamente original quando procura argumentos para suas
atitudes. O que a move é sempre um desses três fatores: dinheiro, dinheiro e
dinheiro. É dentro dessa premissa imutável que se deve buscar a grande questão
que emergiu depois do editorial em que a empresa rompe com o golpe. Em 1964, a
adesão aos golpistas foi motivada por dinheiro. E isso veio em proporções
monumentais. Uma editora medíocre, com um jornal de segunda linha, virou o que
virou com as mamatas dadas pelos militares em troca do apoio à ditadura. Agora,
a Globo perderia muito dinheiro – e provavelmente o futuro – se alinhando com
os golpistas. Não dando certo o golpe - e não daria - o risco era ver secar a
verba multimilionária da propaganda federal”.
O gesto da Globo se explica e se encerra no dinheiro. Muito se especulará sobre
os detalhes que se traduzirão nisso – dinheiro. Mas uma coisa é batata. Os
aloprados da Globo entenderam perfeitamente o editorial. Assim como elevaram
brutalmente o tom nos últimos meses, agora diminuirão na mesma proporção.
Roberto Marinho sabidamente gostava de papistas, gente que obedece sem
restrições ao Papa. Evandro de Andrade, chefe de jornalismo do Globo e depois
da TV Globo, convenceu RM a dar-lhe o cargo com uma carta em que garantia ser
papista. Os irmãos Marinhos, como o pai, também gostam de papistas. Dada a
ordem contida no editorial, esperarão de seus aloprados, de Kamel a Merval, uma
resposta imediata. E eles sabem disso.
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De fato, a hipótese da razão monetária tem consistência. Basta lembrar o
balanço publicado pelo repórter Fernando Rodrigues, do site UOL, no final de
junho passado. O estudo revelou que a Rede Globo e as cinco emissoras do grupo
(São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Brasília e Recife) receberam um total
de R$ 6,2 bilhões em publicidade estatal federal durante os 12 anos dos
governos Lula (2003 a 2010) e Dilma (2011 a 2014). O montante é ainda maior se
somado aos valores pagos às afiliadas. A RBS, afiliada da Globo no Rio Grande
do Sul e em Santa Catarina, recebeu R$ 63,7 milhões de publicidade estatal
federal de 2003 a 2014; a Rede Bahia teve um faturamento de R$ 50,9 milhões no
mesmo período. Já a TV Tem, maior afiliada da TV Globo no país, de propriedade
de J. Hawilla, empresário metido nos escândalos de corrupção na Fifa, faturou
R$ 8,5 milhões de publicidade estatal federal somente em 2014.
Somada todas estas possíveis explicações para o “recuo tático”, mesmo assim
fica a pergunta: dá para confiar? A história do Brasil – com o suicídio de
Vargas, a desestabilização de Kubitschek, o golpe contra Jango, o boicote às
Diretas-Já, a farsa do “caçador de marajás”, a blindagem ao “príncipe da
privataria” e outras ações golpistas – desaconselha qualquer tipo de ilusão no
que se refere à famiglia Marinho. A conferir como será a “cobertura
jornalística” dos seus vários veículos nos próximos dias. Nas marchas golpistas
de março e abril, a TV Globo chegou a mudar a sua grade de programação para
apoiar os grupelhos fascistas. Celebridades globais produziram vídeos
conclamando os protestos. “Calunistas” ficaram excitados com o “Fora Dilma”. E
agora? Como a Rede Globo se comportará? O editorial e a confissão de João
Roberto Marinho são para valer ou só para enganar os ingênuos?
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