MARILENA CHAUÍ: O IMPEACHMENT E O ÓDIO DE CLASSES
“Queria, por um segundo, retomar o que disse Paulo Arantes e
manifestar a preocupação que tenho desde agosto de 2013 e manifesto em público,
em privado e por escrito. Agosto foi o instante no qual se deu a virada em
relação ao que se passara no movimento vitorioso do Passe Livre. Quando os
meninos tentaram, com seus símbolos e bandeiras, comemorar na avenida Paulista,
foram batidos e ensanguentados por pessoas vestidas com a bandeira do Brasil e
que diziam: ‘meu partido é o meu país’.
Já vimos, os mais velhos,
esta cena acontecer no Brasil, em 1964. O processo de impeachment é apenas a
cereja no bolo de um processo muito mais longo e complicado que vem ocorrendo.
Queria lembrar que certos projetos de lei que tramitam na Câmara e no Senado
deveriam ter sido objeto também de manifestações gigantescas. A mudança na
maioridade penal. A ‘Lei Anti-terrorismo’, que não vai pegar apenas nós, que
estamos reunidos aqui. Os primeiros, mostra a fala do Ronaldo Caiado, serão os
meninos do MST.
Está sendo preparada no Brasil uma gigantesca vitória, na luta
de classes, do capital. A tentativa de impeachment apenas coroa este longo
processo. Não é por acaso que, quinze dias atrás, Fernando Henrique Cardoso deu
uma entrevista na qual dizia: ‘o mercado é favorável ao impeachment’. Acho
fantástico um sociólogo daquele porte dizer ‘o mercado’… (risos), como se fosse
um ente existente em si, por si, uma entidade metafísica! (apalusos). A classe
dominante quer e a classe médio proto-fascista, que existe neste país, apoia.
No Brasil, o autoritarismo não é uma questão política, mas uma característica
estrutural de uma sociedade oligárquica, vertical, hierarquizada, que opera
exclusivamente com os princípios da desigualdade e do mando e obediência. É
esta sociedade que está sendo puxada para colocar a cereja em cima do bolo.
Por isso, o ato unitário
e apartidário é essencial como defesa da democracia. Significa, no Brasil, a
defesa dos explorados, dos humilhados, dos oprimidos, daqueles que são, há mais
de quinhentos anos, o sustentáculo da riqueza deste país e a fonte de todo o
sofrimento existente aqui. É contra eles que a classe dominante está se
mobilizando neste país, tendo sempre como seu acompanhante favorito esta classe
média autoritária e proto-fascista.
Amigos, amigas, temos uma
tarefa histórica. Não é apenas esta luta aqui e agora para impedir o golpe. É
uma luta na qual nós vamos explicar que se o golpe vier, não só os experimentos
de justiça social vão desaparecer. Se o golpe vier, nós teremos, por conta de
toda a discussão em torno do terrorismo internacional, uma ditadura que nos
fará imaginar que a de 1964 foi pão doce com bolacha (aplausos e risos).
Este ato não é apenas
para nós garantirmos a nós mesmos que não estamos passivos. Este ato é e tem de
ser, para nós, o primeiro passo de uma luta histórica que começa contra o golpe
e prossegue como luta pela democracia e por justiça social. A luta continua!”
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