EUA Deixam Para Trás Um Iraque Arrasado
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Mais uma vez, os Estados
Unidos concluem uma guerra sem ganhá-la, ao não conseguir impor sua plena
vontade aos agredidos. Os soldados norte-americanos não saem do Iraque como
saíram de Saigon, em 30 de abril de 1975, escorraçados pelas tropas de Hanói e
pelos vietcongs. Desta vez, eles primeiro arrasaram o Iraque, durante uma
década de bombardeios constantes.
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O despotismo de Saddam não incomodava
antes os Estados Unidos, quando coincidia com o interesse de Washington. Tanto
era assim, que os norte-americanos estimularam a guerra contra o Irã, e lhe
ofereceram suporte bélico e diplomático, mas seu objetivo era o de debilitar os
dois países. No momento em que — cometendo erro político elementar — Saddam
pretendeu restaurar as fronteiras históricas do Iraque, ao invadir o Kueit,
Washington encontrou, com o primeiro Bush, o pretexto para a agressão aérea a
Bagdad, a criação da chamada zona de exclusão, em que o bombardeio aéreo era
indiscriminado, e o bloqueio econômico.
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Foram dezenas de milhares de
mortos durante os dez anos de ataques aéreos, prévios à invasão. Entre os
sobreviventes da agressão, houve milhares de crianças, acometidas de leucemia
pela radiação das munições amalgamadas com urânio empobrecido.
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Assim, ao invadir o país por
terra, os americanos encontraram um exército debilitado, parte do território
arrasado e um governo na defensiva diplomática. O pretexto, que os fatos
desmoralizaram, era o de que Saddam Hussein dispunha de armas de destruição em
massa.
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Ontem, o presidente Obama
disse que o Iraque é hoje um “país independente, livre e soberano, muito melhor
do que era com Saddam”. Saddam, sabem os observadores internacionais, era muito
menos obscurantista do que os príncipes da Arábia Saudita.
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Seu povo vivia relativamente
bem, suas mulheres não eram tratadas com desrespeito e frequentavam a
universidade. Algumas ocupavam cargos importantes no governo, na vida acadêmica
e nos laboratórios de pesquisas. Havia tolerância religiosa, não obstante a
divergência secular entre os sunitas e os xiitas, que ele conseguia
administrar, a fim de assegurar a paz interna.
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O vice-primeiro-ministro
Tarik Aziz era católico, do rito caldeu. País de cultura islâmica, sim, mas
talvez o mais aberto de todos eles a outras culturas e costumes. O país se
encontrava em pleno desenvolvimento econômico, com grandes obras de
infraestrutura, e mantinha excelentes relações com o Brasil, mediante a troca
de petróleo por tecnologia e serviços de engenharia, quando começaram os
bombardeios.
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Depois disso, nos últimos
nove anos, a ocupação norte-americana causou a morte de mais de 100 mil civis,
20 mil soldados iraquianos e 4.800 militares invasores, dos quais 4.500 ianques.
Milhares e milhares de cidadãos iraquianos ficaram feridos, bem como soldados
invasores, a maioria deles mutilados. As cidades foram arrasadas — mas se
dividiram os poços de petróleo entre as empresas dos países que participaram da
coligação militar invasora.
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Hoje não há quem desconheça
as verdadeiras razões da guerra, tanto contra o Iraque, quanto contra o
Afeganistão: a necessidade do suprimento de petróleo e gás, do Oriente Médio e
do Vale do Cáspio, aos Estados Unidos e à Europa Ocidental. Daí a guerra
preemptiva e sem limites, declarada pelo segundo Bush, que se dizia chamado por
Deus a fim de ir ao Iraque matar Saddam Hussein. Não só os mortos ficam da
agressão ao Iraque. Os americanos saem do país, deixando-o sem energia elétrica
suficiente, sem água potável, com 15% de desempregados e, 85% dos que trabalham
estão a serviço do governo.
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Toda a história dos Estados
Unidos foi construída no afã da conquista e da morte. Desde a ocupação da Nova
Inglaterra, não só os índios conheceram a sua fúria expansionista: na guerra
contra o México, o país vencido perdeu a metade do território pátrio, o que
corresponde a quase um terço do atual espaço norte-americano no continente.
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A partir de então, a ânsia
imperialista dos Estados Unidos não teve limites. Suas elites dirigentes e seus
governantes, salvo alguns poucos homens lúcidos, moveram-se convencidos de que
cabia a Washington dominar o mundo. Ainda se movem nessa fanática determinação.
Agora, saem do Iraque e anunciam que deixarão também o Afeganistão, no ano que
vem. Mas, ao mesmo tempo, dentro da doutrina Bush da guerra sem fim,
preparam-se para nova agressão genocida contra o Irã.
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Os Estados Unidos nunca
conheceram a presença de invasores estrangeiros. Sua guerra da independência se
fez contra tropas britânicas, que não eram invasoras, mas sim ocupantes da
metrópole na colônia. As poucas incursões mexicanas na fronteira, de tão
frágeis, não contam. Mas há uma força que cresce, e que não poderão derrotar: a
do próprio povo norte-americano, cansado de suportar o imperialismo interno de
seus banqueiros e das poucas famílias bilionárias que se nutrem da desigualdade.
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O povo, mais do que tudo, se
sente exaurido do tributo de sangue que, a cada geração, é obrigado a oferecer,
nas guerras sem glória, contra povos inermes e quase sempre pacíficos, em nome
disso ou daquilo, mas sempre provocadas pelos interesses dos saqueadores das
riquezas alheias.
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A situação tomou rumo novo, a
partir dos anos 80, como apontou, em artigo publicado ontem por El Pais, o
biólogo e filósofo catalão Federico Mayor Zaragoza, ex-ministro da Educação de
seu país e, durante 12 anos, diretor-geral da Unesco. A aliança de interesses
entre Reagan e Margareth Thatcher significou a capitulação do Estado diante do
mercado, e se iniciou a era do verdadeiro terror, com 4 bilhões de dólares
gastos a cada dia, em armamentos e outras despesas militares, e, a cada dia, 60
mil pessoas mortas de fome no mundo.
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Mayor lembra a que levou o
novo credo das elites, que Celso Furtado chamou de “fundamentalismo mercantil”:
a melancólica erosão da ONU e sua substituição por grupos plutocráticos, como o
grupo dos 7, dos 8 e, agora, sob a pressão dos emergentes, dos 20. E na pátria
da nova fé nas “razões do mercado”, os Estados Unidos, há hoje 20 milhões de
desempregados, 40 milhões de novos pobres e 50 milhões de pessoas sem qualquer
seguro de saúde.
A Europa assediada e perplexa
com a falência de suas instituições políticas, está presa na armadilha do euro,
que não tem como concorrer com o dólar nem com o yuan, porque yuan e o dólar
são emitidos de acordo com a necessidade dos Estados Unidos e da China. Disso
conseguiu escapar a Inglaterra, que mantém a sua moeda própria.
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Os Estados Unidos, se não
houver a reação, esperada, de seu povo, se preparam para manter o terror no
mundo, mediante suas armas eletrônicas de alcance global, entre elas os aviões
não tripulados. Seu destino, se assim ocorrer, será o do atirador solitário,
que se compraz em assassinar os inocentes à distância, até que alguém consiga,
com o mesmo método, abatê-lo. E não faltam os que se preparam para isso.
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Por Mauro Santayana
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