Filme "As Canções" - De Eduardo Coutinho

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A primeira canção, interpretada por uma senhora meio desafinada e que adentrou ao palco inesperadamente, levou minha filhota Kekel, de doze anos, a desabar em sorrisos contidos pela mãe. Ela costuma nos acompanhar sempre ao Cinema da Fundação Joaquim Nabuco (sala pequena, mas aconchegante, freqüentada pela parcela mais pensante da cidade), e de lá sai gostando de filmes como “Melancolia” e outros do mesmo naipe.  A intérprete dessa primeira canção, voltaria mais tarde, para relatar seu inusitado caso de amor que marcou sua vida. A interrupção de um relacionamento amoroso (e suas consequências habituais e muitas vezes devastadoras) está entre as experiências mais dolorosas vividas pelas pessoas. No novo filme do documentarista carioca Eduardo Coutinho, “As Canções”, esse momento delicado surge representado por músicas do cancioneiro popular brasileiro, que refletem ou ilustram fases distintas do processo de rompimento de cada entrevistado que narra sua vivência.
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Não que “As Canções” seja um filme sobre dores. É, na verdade, um filme sobre o amor em suas várias maneiras de se manifestar. O que acontece é que quase todos os relatos (e músicas) apresentados dizem respeito a momentos definitivos da vida amorosa – seja o esfacelamento total, seja um processo que se inicia na ferida e culmina na alegria do acerto, do rearranjo e da esperança.
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“É sobre afetos e sobre os sentimentos mais básicos que existem”, disse Coutinho. Vencedor do Festival do Rio na categoria de melhor documentário com “As Canções”, o veterano realizador de 78 anos diz que seu novo trabalho foi o filme “mais fácil de fazer” em sua carreira. “Não tentei intelectualizar nada. As pessoas sentavam ali, falavam suas histórias e cantavam”.
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O documentário é mais um marco da galeria dos fortes trabalhos de Eduardo Coutinho realizados nos últimos 15 anos, que produziu obras como como “Edifício Master” (2002), “Peões” (2004), “O Fim e o Princípio” (2006) e “Jogo de Cena” (2007). Em todos, anônimos se sujeitam a se expor diante do cineasta, a contar situações muito particulares e a se emocionarem no processo. É um procedimento único no Brasil, em que o realizador volta-se à intimidade, aos erros e acertos, às loucuras e traições, aos arrependimentos e perdões, às lágrimas e ao riso.
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“As Canções” se constitui de 18 depoimentos, selecionados de um total de 42 entrevistas gravadas por Coutinho. Diferente de “Jogo de Cena” (2006), projeto similar em diversos aspectos, desta vez o cineasta não conseguiu capitanear pessoas através de anúncios em jornal ou na internet. Resolveu, então, colocar pesquisadores no largo da Carioca, no Rio, portando placas onde se lia: “Você tem uma canção importante na vida?”. Quem se interessasse e parasse, era ouvido (falando e cantando) e então escolhido ou não por Coutinho – que tentava colher as melhores histórias.
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“Selecionava os relatos mais fortes e evitava qualquer tipo de preconceito em relação ao meu gosto musical”, conta o diretor. No filme, o autor mais lembrado, presumivelmente, foi Roberto Carlos. Isso não causou surpresa em Eduardo Coutinho, que, em outros tempos, chegara a estudar a possibilidade de fazer um filme apenas sobre as músicas do Rei. “Ia ficar muito caro”, explica, sobre a desistência em referência a pagamento de direitos autorais.
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Outros compositores que vão surgindo a cada entrevista de “As Canções” são Noel Rosa, Orlando Silva, Nelson Gonçalves, Armando Louzada, Carlos José e Silvinho. A composição mais recente (ou menos antiga) é de Jorge Ben Jor, “Que Nega É Essa”, gravada em 1972. “Os casos narrados aconteceram faz muito tempo, então é natural que sejam recordados com músicas de outras épocas. Afinal, o passado é o presente”, comenta Coutinho.
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Cada pessoa que surge em “As Canções” (sempre sentada numa cadeira, de frente para a câmera, num fundo preto) tem uma vivência tão particular quanto universal. Dificilmente algum espectador não se verá refletido em aspectos surpreendentes das lembranças expostas à câmera de Coutinho e nas letras das composições amplificadas pelo som do cinema. Especialmente os que vivem ou viveram um desacerto amoroso.
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À saída do cinema, e pelos primeiros dias seguintes, demos boas gargalhadas ou nos compadecemos com as narrativas, além de tentarmos imaginar a história de vida de cada um daqueles cantores/narradores.

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Comentários

  1. Imagino que o lugar seja Recife. Questiono se há parcela mais pensante ou menos pensante... se houver... a alguém que a tranque ali ... Encontrei este blog sapeando sobre o filme e como veio o nome bastidor, aqui caí. Fiquei curiosa sobre o que a criança absorveu do filme.

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