Conluio Veja-TV Globo, Máquina de Criar Falsos Escândalos
Por J.
Carlos de Assis, via Escrivinhador, por e-mail
Que “Veja” e Tevê
Globo, por força de seu proselitismo de extrema direita, inventem um
escândalo relacionado com a CPI da Petrobrás para desacreditar o Governo, nada
de novo. Que os dirigentes do Senado e da dita CPI levem isso a sério, ao ponto
de determinar investigações, é extremamente grave. Significa que não há um
processo preliminar de avaliação de pseudo-denúncias pelo qual alguém que
ostente a credencial de Senador da República acabe passando o recibo de ser um
simples idiota.
Já fui secretário de CPI
da Câmara dos Deputados. Era comum que fizesse uma lista de perguntas sobre
questões específicas aos depoentes. Meu interesse, na condição de auxiliar da
instituição CPI, era o esclarecimento de fatos e de situações de seu interesse.
Jamais passaria pela minha cabeça esconder minhas perguntas. Não estava num
programa de pegadinhas na televisão. Meu interesse não era forçar contradições
do depoente, mas colocá-lo diante de questionamentos objetivos para trazer a
verdade à tona.
Já auxiliei pessoas a prestarem
depoimentos em CPI ou a participarem de debates públicos. Meu papel, nesses
casos, tem sido o de simular à exaustão respostas a possíveis perguntas ou
respostas a diferentes questionamentos de conhecimento público, incluindo
prováveis provocações por interesses escusos. Só um idiota vai para uma
inquirição pública ou debate sem alguma forma de preparação. Em geral, nossa
memória é fraca. E numa situação em que há algum nível de hostilidade
ideológica, todo cuidado é pouco.
O “crime” postulado por
“Veja” e catapultado em nível nacional pela Globo, num conluio explícito para
desacreditar o Governo, consiste na afirmação de que depoentes vinculados à
Petrobrás tiveram acesso a perguntas que seriam feitas na CPI. Ora, ou essas
perguntas são objetivas, visando a algum esclarecimento efetivo, ou são
pegadinhas, para forçar contradição do depoente. No primeiro caso, a
antecipação da pergunta, se houve, não teria qualquer efeito no esclarecimento
dos fatos. Contudo, se é uma pegadinha, não tem nenhum efeito objetivo
sobre o curso da CPI, exceto, talvez, a humilhação episódica do depoente.
Entretanto, essa não é
propriamente a questão, mas seu contexto. O fundamental é que não se pode fazer
uma investigação no Senado sobre algo que não existe. Acaso seria crime um
depoente ter acesso a perguntas a que seria submetido? Acaso preparar um
depoente para responder perguntas na CPI seria crime? Onde está a fraude?
Preparar-se adequadamente para uma CPI honra a instituição do Congresso.
O depoente poderia
simplesmente chegar lá e calar-se. Naturalmente que, para “Veja” e Tevê Globo,
o espetacular, para mexer com a emoção do povo, seria que alguém, pego de
surpresa, cometesse o percalço de confessar algum crime na CPI a fim de que
saísse de lá com algemas. Isso, já se viu, não acontecerá na CPI da Petrobrás
simplesmente porque não houve crime. Portanto, é preciso inventar algum na sua
periferia.
No meu tempo de
jornalismo, inaugurei no Brasil o jornalismo investigativo na área econômica
denunciando vários escândalos financeiros do período da ditadura, ainda na
ditadura. Era um trabalho solitário. Não havia ajuda da Polícia Federal, que na
época só se preocupava em prender comunistas; não havia apoio do Ministério
Público e da própria Justiça (com raríssimas exceções), serviçais do poder
militar; ou do próprio conjunto da imprensa, que se mantinha omissa com
medo do Governo ou do anunciante.
Não obstante, com o apoio
de meu jornal, pude enfrentar grandes blocos de poder político e econômico pela
razão elementar de que tinha uma premissa: na denúncia, é preciso ter um código
de ética que leve em conta a solidez das provas, a clareza do crime ou da
irregularidade, e a inequívoca identidade dos autores.
O código de “Veja” é
diferente. Em vez de provas, basta-lhe uma gravação que algum agente desonesto
da Polícia ou um espião privado lhe entreguem comprometendo, num contexto
nebuloso, alguma pessoa suspeita de governismo; é totalmente dispensável
identificar a ação denunciada como crime ou irregularidade; os autores podem
ser difusos, desde que comprometam de alguma forma o Governo. Assim, coma
gravação deturpada de um lado e o apoio da Tevê Globo do outro, “Veja” produz
um escândalo com som retumbante o suficiente para que o Senado a leve a sério.
Em três livros sobre a
patologia dos escândalos da era autoritária – A Chave do Tesouro, Os Mandarins
da República e A Dupla Face da Corrupção -, em vez de me limitar à história dos
escândalos em si, procurei mostrar a institucionalidade que permitiu sua
eclosão. Vou fazer o mesmo, resumidamente, para que se entenda a patologia dos
“escândalos” denunciados por Veja.
A revolução da informática
expulsou os jornais da notícia; como reação, o jornalismo escrito tenta se
refugiar na análise. A revista ficou com seu espaço diminuído, porque está
distante da notícia (diária) e com pouca eficácia na análise, campo dividido
com os jornais. Como consequência, seu campo favorito tornou-se o escândalo.
Notem que, de duas em duas semanas, “Veja” expõe um, às vezes elevando
roubo de galinha a categoria de grandes escândalos. Quando nem isso existe, ela
inventa. Daí a “fraude” na CPI.
P.S. Para que não me interpretem
equivocadamente, devo dizer que não sou governista, não sou do PT nem apoio
integralmente a política do PT. Admiro as políticas sociais dos governos Lula e
Dilma, mas discordo de sua política macroeconômica, que considero responsáveis
pelo mau desempenho da economia brasileira. Não obstante, não saio por aí
inventando escândalos para dar suporte a candidatos neoliberais de extrema
direita na atual disputa eleitoral.
J. Carlos de Assis –
Economista, doutor em Engenharia de Produção pela Coppe-UFRJ, professor de
Economia Internacional da UEPB, autor de mais de 20 livros sobre economia
política brasileira.
Comentários
Postar um comentário
comentário no blogspot