Como o Netflix conquistou a classe C e, aos poucos, com a Amazon, vai matar a Globo
Os filhos do Marinho vamos pegar de surpresa…
por Luiz Carlos Azenha, de Nova York
Antes desta minha mais recente viagem
encontrei Thiago, que estava animado com sua nova conquista: uma TV que conecta
na internet. Ele comprou o aparelho no Black Friday, por menos de mil reais.
Considerando que Thiago e a esposa ascenderam
durante os governos Lula e Dilma mas economicamente ainda se encaixam na classe
“C”, fiquei surpreso. Por que abandonar as novelas da Globo, das quais o casal,
no passado, foi fiel consumidor?
Resposta do Thiago: assinei o Netflix, agora
quero ver filmes e series de TV a qualquer hora. Bingo! Menos um para a “grade”
de programas dos Marinho, grade que tem sentido literal para jovens como
Thiago, jovens que gostam da liberdade de definir seus próprios horários de
entretenimento.
Desembarco em Nova York e aqui só se fala, nos
meios televisivos, da disputa entre o Netflix e a Amazon, ambos agora no papel
de produtores de conteúdo exclusivo.
Cada vez mais, as redes de TV tradicionais
transpiram um cheiro de naftalina.
Com a série Transparent,
que retrata um transsexual que aos 68 anos de idade decide viver como mulher, o
canal da Amazon na internet ganhou seu primeiro Golden Globe, na categoria
melhor comédia. Na internet, o feito antes era exclusivo do Netflix, com suas
séries House of
Cards e Orange is the new black.
Como resultado do sucesso de suas séries, o
Netflix acaba de bater nos 50 milhões de assinantes. Em períodos recentes, mais
da metade do crescimento veio do exterior, ou seja, de gente como Thiago.
Visando estimular acesso ao seu canal Prime,
a Amazon acaba de assinar contrato com Woody Allen, que produzirá sua primeira
série de TV para passar inicialmente… na internet!
A aposta dos dois gigantes se concentra em
temas ousados. Nem a Amazon, nem o Netflix buscam o público mediano, como faz a
Globo com suas telenovelas. Para fisgar os jovens de até 30 anos faz-se
necessário violar todos os tabus de um país puritano.
Por isso, House of
Cards viaja pelos
corredores corrompidos do poder, num roteiro que jamais caberia nas sisudas
ABC, CBS ou NBC.
Desde que a HBO inventou o slogan ” it’s not
TV, it’s HBO”, demarcando um novo território para as séries
norte-americanas, os Estados Unidos vivem um boom no setor, produzindo joias como The Sopranos,Breaking
Bad e Homeland.
No Brasil, isso seria impensável, por conta
do virtual monopólio da Globo. A empresa dos Marinho controla, do Rio, de
maneira verticalizada, 80% da capacidade de produzir conteúdo, concentrando
atores, diretores, produtores, roteiristas, etc.
Nos Estados Unidos, por lei, nenhuma rede de
TV pode produzir tudo o que coloca no ar. Precisa comprar de terceiros. Isso
incentivou, ao longo do tempo, o desenvolvimento de uma cadeia de produtoras
independentes em praticamente todos os grandes mercados do país.
Agora, com Netflix e Amazon entrando na
disputa, esse mercado ficará ainda mais fortalecido. Ambas visam atingir o
público através de plataformas móveis, especialmente do celular.
Enquanto no Brasil discutimos se e quando o
jornal de papel vai acabar, aqui nos Estados Unidos o debate é sobre
quando o computador desktop vai se tornar obsoleto.
Segundo Gian Fulgini, da Comscore, nos
últimos 4 anos o tempo de uso de internet dos norte-americanos teve
acréscimo de 157%.
Hoje, os usuários de celular dos Estados
Unidos passam mais da metade do tempo… na internet.
Que tal assistir a um capítulo do House of Cards em seu celular, durante uma viagem de
trem entre Nova York e Washington?
Para os irmãos Marinho, o problema é que
este conteúdo também estará disponível para o motorista preso num
congestionamento na Mogi-Bertioga ou bem ali, no Jardim Botânico.
Todo o Brasil vai acabar pagando, para os
Estados Unidos, o pesado pedágio por ter mantido um setor tão importante da
economia praticamente monopolizado e, portanto, engessado.
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