José Dirceu: Uma Estrela Cadente
A direção
e os principais expoentes do Partido dos Trabalhadores preferiram manter
distância do ex-ministro José Dirceu, novamente preso em 3 de
agosto, desta vez por determinação do juiz Sergio Moro. Entre parcas declarações
protocolares contra a “perseguição ao partido” e defesas raquíticas do Estado
de Direito, a maioria optou mesmo pelo silêncio. A apatia não se deve apenas ao
desconforto da militância em fazer uma defesa aberta de Dirceu, principalmente
depois da descoberta de que sua consultoria recebeu, segundo os investigadores,
cerca de 39 milhões de reais do esquema de corrupção na Petrobras. Revela,
antes de mais nada, a perplexidade dos dirigentes ante a derrocada da
agremiação e das dúvidas sobre o futuro.
Dirceu, neste cenário, é o menor dos
problemas. Enquanto a prisão do ex-ministro serve no máximo à catarse da porçãoantipetista da
opinião pública, o acordo de delação premiada assinado por Renato Duque,
ex-diretor de Serviços da Petrobras, abre a perspectivas de estragos bem
maiores no patrimônio político e eleitoral construído pelo PT ao longo das
décadas e reforçado durante os dois mandatos de Lula. Na divisão das propinas na estatal,
segundo a força-tarefa da Lava Jato, Duque cuidava da parte que
cabia ao Partido dos Trabalhadores no latifúndio, enquanto Paulo Roberto Costa
representava o PP e Nestor Cerveró, o PMDB.
Os
investigadores esperam que Duque detalhe suas relações com deputados, ministros
e dirigentes petistas, além de esclarecer se e como as propinas eventualmente
irrigaram campanhas eleitorais do partido. Um dos delatores do esquema, o
ex-gerente da estatal Pedro Barusco sustenta que o PT teria recebido 200
milhões de dólares do esquema. Ex-chefe de Barusco na Petrobras, Duque pode ou
não confirmar a acusação.
As provas contra o ex-diretor da
estatal avolumam-se. A Lava Jato encontrou contas no exterior, contratos de sua
consultoria com empreiteiras acusadas de participar do esquema e transferências
suspeitas a seu favor realizadas por uma companhia de fachada do lobista Milton
Pascowitch. Por causa do cerco e do longo período de prisão (desde 16 de
março), Duque decidiu colaborar com a Justiça.
Já
Dirceu rechaça a possibilidade de se tornar delator, embora sua situação não
seja confortável. Há cerca de um mês o ex-ministro ingressou com pedidos de
habeas corpus antecipado para evitar uma nova prisão. Segundo a força-tarefa,
Pascowitch e outro colaborador, Ricardo Pessoa, ex-executivo da construtora
UTC, afirmaram que parte dos 39 milhões de reais pagos à JD, consultoria de
Dirceu, eram propina. Para Moro, a detenção se justifica, apesar de o petista
cumprir prisão domiciliar da pena decorrente do processo do chamado mensalão,
pelo fato de Dirceu ter realizado operações fraudulentas durante esse período.
Ao descartar a relação entre o “mensalão” e o escândalo investigado pela Lava
Jato, Luís Roberto Barroso, ministro do Supremo Tribunal Federal, autorizou a
transferência do ex-ministro de Brasília para a carceragem da Polícia Federal
no Paraná.
De Curitiba, aliás, veio esta semana mais uma
condenação envolvendo executivos das empreiteiras integrantes do cartel na
estatal. Cinco ex-diretores da OAS foram condenados a penas que variam de
quatro a 16 anos de cadeia, entre eles o presidente da empresa, José Aldemário
Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro. As acusações são de corrupção, lavagem de
dinheiro e organização criminosa. Eles se juntam a três executivos da Camargo
Corrêa também sentenciados pelo juiz Sergio Moro. Dois dos executivos
condenados a 15 anos tiveram penas reduzidas a 2, por conta de uma delação
premiada. O executivo que se recusou a colaborar pegou 9 anos. Esperam-se
até dezembro as sentenças contra todos os outros empresários denunciados em
outros processos.
No caso do ex-ministro, a tese de que
os fins justificam os meios não poderá ser mais usada, nem do ponto de vista
ideológico. Dirceu, aponta a investigação, valeu-se dos recursos para fins
pessoais, incluída a aquisição de um apartamento e de um avião e a reforma de
uma casa. A prisão do ex-ministro provocou uma reviravolta na teoria sustentada
pela força-tarefa até agora. O esquema antes descrito como um cartel de
empreiteiras passou a ter um mentor e beneficiário: Dirceu. Tal mudança de
perspectiva se sustentará ao longo da investigação? A ver.
Segundo os delegados federais e
procuradores, Dirceu nomeou Duque para cuidar desses interesses. O engenheiro
de carreira da Petrobras chegou à direção da estatal por indicação do ex-ministro.
Permaneceu no cargo entre 2003 e 2012. Sob a diretoria comandada por Duque, de
acordo com Pascowitch, o esquema tomou corpo. Em 2003 e 2004, o grupo político
do ex-ministro teria se aproximado de duas empresas de contratação de mão de
obra da estatal para estabelecer uma “relação comercial”.
Dirceu e seu grupo seriam representados
por Fernando Moura, também preso na segunda-feira 3. A Duque caberia viabilizar
os negócios da petroleira. Uma das empresas procuradas por Moura, diz
Pascowitch, foi a Hope RH, encarregada da contratação de mão de obra
especializada. A parceria deu certo. A Hope conseguiu serviços da estatal no
valor de 3,5 bilhões de reais, além de outros 212 milhões da Transpetro, braço
de gás natural e transporte da Petrobras. Ainda segundo Pascowitch, a Hope
pagava, em dinheiro, entre 500 mil e 800 mil reais por mês ao grupo. Moura
embolsaria 180 mil fixos, Duque, 40%, e Dirceu, 30%. O restante ia para o bolso
do próprio Pascowitch. Luiz Eduardo de Oliveira, irmão e sócio de Dirceu na JD,
outro detido, administraria os contratos da consultoria.
Outra pagadora dos “pixulecos”, nome
dado à operação da segunda 3, a 17ª fase da Lava Jato, sinônimo de propina,
seria a Personal Services. Contratada para oferecer mão de obra terceirizada, a
empresa fechou contratos de cerca de 2,2 bilhões de reais e ficaria encarregada
de pagar outros 300 mil mensais ao grupo de Dirceu.
Nem toda a propina seria paga em
dinheiro. O lobista Júlio Camargo afirma que Dirceu usava um avião de sua
propriedade. Mais tarde, Pascowitch teria comprado 50% da aeronave modelo
Cessna, prefixo PT-XIB para quitar uma “dívida” com a JD. Valor: 1,07 milhão de
reais. Após ser flagrado por jornalistas no avião, Dirceu decidiu desfazer o
negócio.
Pascowitch teria entregado ainda
comprovantes que mostram o pagamento da reforma de uma casa usada por Dirceu em
Vinhedo, interior de São Paulo. As obras custaram 1,3 milhão de reais. Os
negócios do ex-ministro com a empresa de fachada do lobista não param por aí. A
Jamp realizou uma operação de aquisição de um imóvel para transferir 500 mil
reais para a conta de uma filha do petista.
Para
embasar o pedido de prisão, a Polícia Federal fez uma devassa em todas as
operações da JD Assessoria. São ao menos 500 folhas de análises de depósitos,
relações de ligações telefônicas, beneficiários de transferências e grau de
relacionamento ou parentesco com o ex-chefe da Casa Civil. Neste amontoado de
documentos chama atenção os pagamentos feitos por empresas da área de publicidade
à consultoria.
A
247 Inteligência Digital realizou 39 transferências bancárias mensais no valor
total de 732 mil reais. A empresa é sócia da MPV7 Comércio e Serviços, apontada
pela Lava Jato como uma das intermediadoras de propina no esquema de desvios de
recursos de contratos de publicidade da Caixa Econômica Federal e do Ministério
da Saúde por meio do ex-deputado André Vargas. A empresa de comunicação
ABCDEFGHI Participações repassou 206 mil. As duas empresas, diz a PF, pertencem
ao Grupo ABC, que tem entre seus sócios o publicitário Nizan Guanaes. Segundo o
grupo, a JD realizou análises do cenário político brasileiro e
latino-americano.
Quem apareceu no esquema foi a Editora 247, responsável pelo
site Brasil 247. Esse site, aponta Pascowitch, teria recebido dois pagamentos
de 60 mil
reais da Jamp a pedido de João Vaccari, tesoureiro do PT. O Ministério Público Federal chegou a pedir a prisão, busca e apreensão e bloqueio de bens do editor-chefe do site, o jornalista Leonardo Attuch. Moro indeferiu os pedidos, por entender que a investigação deveria avançar para esclarecer melhor o caso. Ex-desafeto do PT, Attuch tornou-se um apoiador do partido nos últimos tempos. A editora nega o recebimento de propina. Os pagamentos, afirma em nota oficial publicada no site, referem-se a reportagens sobre engenharia nacional.
reais da Jamp a pedido de João Vaccari, tesoureiro do PT. O Ministério Público Federal chegou a pedir a prisão, busca e apreensão e bloqueio de bens do editor-chefe do site, o jornalista Leonardo Attuch. Moro indeferiu os pedidos, por entender que a investigação deveria avançar para esclarecer melhor o caso. Ex-desafeto do PT, Attuch tornou-se um apoiador do partido nos últimos tempos. A editora nega o recebimento de propina. Os pagamentos, afirma em nota oficial publicada no site, referem-se a reportagens sobre engenharia nacional.
A prisão de Dirceu, de qualquer forma, estimula o sentimento antipetista
de uma parte da sociedade e alimenta os movimentos pró-impeachment que sairam às ruas
ontem - domingo 16. É um ambiente no qual também viceja o ódio puro e simples,
a exemplo do atentado contra a sede do
Instituto Lula. O responsável pela bomba caseira lançada do interior de um
carro ainda não foi identificado pela Polícia Civil do governo Geraldo Alckmin.
De pouco adianta a manifestação do
Ministério Público Federal de que Lula não está na iminência de ser preso ou
mesmo que esteja sob investigação. Segundo o procurador Carlos Fernando Lima,
não há no momento “possibilidade real” de o ex-presidente ir para a cadeia. A
boataria faz parte do inferno astral vivido pelo PT.
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