O DESMANCHE DE SERGIO MORO
Moro, o juiz que morre de medo de "virar gente"
Professor de pós-graduação em Direito da Universidade do
Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), em São Leopoldo (RS), com atuação no
Ministério Público de 1986 a 2014, autor de mais de quarenta
livros, Lenio Luiz Streck deu uma longa e elucidativa entrevista a Paulo
Henrique Arantes, editor uma revista especializada da área.
Polemista aguerrido, Streck envolveu-se, recentemente, numa discussão com o juiz Sérgio Moro em seu Facebook em torno do caso do pecuarista Bumlai.
Eis apenas um trecho:
O que senhor achou das 10 propostas contra corrupção
elaboradas pelo Ministério Público, as quais estão sendo apreciadas no
Congresso?
Eu fui à Câmara e fiz um depoimento no dia da posse da
ministra Carmem Lúcia. Coloquei lá minha posição de contrariedade em
relação à maioria das propostas, porque são nitidamente punitivistas,
quebram garantias. Por exemplo, a tentativa de enfraquecer o habeas corpus é uma coisa estarrecedora, depois de tudo que a civilização lutou pelo habeas corpus.
Por incrível que pareça, o Ministério Público, como guardião
da cidadania, com tudo que seu papel representa… eu fico impressionado
com a coragem do Ministério Público de querer enfraquecer o remédio
heroico – o habeas corpus é o remédio heroico, “traga-me o corpo”, do Século XIII.
Mas talvez o ponto mais absurdo de todos seja o teste da integridade, que eu chamo de fator minority report,
como naquele filme em que o sujeito era punido antes de cometer o
crime, porque existia um modo de saber que ele ia cometer um crime.
Além disso, a transformação de alguns crimes em crimes
hediondos ou o aumento das penas por corrupção a mais de 20 anos, o
dobro do homicídio. Eles estão mais preocupados com a corrupção ou com o
patrimônio do que com a vida das pessoas.
Não é papel do Ministério Público fazer propostas
anticorrupção do modo como foi feito, isso é papel do Parlamento. Não
são proibidas iniciativas populares, mas não me parece que devam ser
feitas em conjunto, aproveitando uma certa onda que se criou de ser
contra a impunidade. Qualquer pessoa que é perguntada se é a favor da
corrupção diz que não, mesmo o corrupto.
Eu penso que algumas das propostas poderiam até ser acatadas
em relação ao enriquecimento ilícito, mas não se pode extrapolar as
penas nem tirar garantias. Não se joga fora a água suja com a criança
dentro. A pior coisa que pode acontecer é alguém achar que, numa
concepção moralista, pode fazer uma espécie de limpeza social.
Sempre haverá vícios e sempre haverá virtudes – é a Fábula
das Abelhas, de Mandeville. Se as pessoas acham que a sociedade deve ter
só virtudes, é bom lembrar dessa fábula.
Eu posso até concordar com a proposta de eugenia cívica,
como eu a chamo, de querer saber de antemão se você tem propensão a
delinquir, desde que ela seja aplicada para deputados, senadores,
ministros do Supremo, ministros do STJ, procuradores-gerais de Justiça,
governadores, prefeitos, presidentes da República.
Ou isso seria só para
a patuleia?
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