Massacre no Charlie Hebdo: Hipocrisia à parisiense
Na primeira fila da marcha pela
“Liberdade Expressão”, convocada pelo primeiro-ministro francês,
governantes com as mãos manchadas por censura, prisões arbitrárias e agressão a
comunicadores
Por Vinicius Gomes, na Revista Fórum
Na esteira
do assassinato de 12 pessoas na última quarta-feira (7) em Paris, entre elas
dois policiais franceses e dez funcionários da publicação semanal
satírica Charlie
Hebdo, as ruas de diversas cidades francesas foram tomadas por
quase 4 milhões de pessoas nesse domingo (11) que marcharam em
solidariedade às vítimas e suas famílias e contra o terrorismo e pela defesa da
liberdade de expressão. Em Paris, a manifestação contou com a presença de
dezenas de líderes mundiais andando de braços cruzados em nome desses valores.
Visualize aqui um rápido
“quem-é-quem” de alguns dos que participaram.
A
hipocrisia pela demonstração de solidariedade às vítimas inocentes da Charlie Hebdo poderia, por exemplo,ser apontada logo
de cara com a presença do primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu,
que há menos de seis meses causou a morte de mais de duas mil pessoas
em Gaza, cerca de 500 delas sendo crianças; mas como a organização
internacional Repórteres Sem Fronteiras escreveu, eles ficaram “estarrecidos pela presença de líderes
de países onde jornalistas e blogueiros são sistematicamente perseguidos” –
citando alguns como o primeiro-ministro da Turquia, os ministros de relações
exteriores do Egito, da Rússia, da Argélia e dos Emirados Árabes, além do
presidente do Gabão.
Porém, um
estudante da London School of Economics foi mais além: Daniel Wickhampostou uma série
de tuítes dando nome aos bois daqueles que andavam de braços cruzados em nome
da liberdade de expressão, quando em seus próprios países eles não parecem tão
preocupados em defendê-la – fato esse que não pode ser classificado como
nada menos do que um show de hipocrisia. Sendo que a mais flagrante foi a
condenação de Raif Badawi, um blogueiro saudita, por “insultar o islã“: 10 anos de prisão e 1.000 chibatadas em
público, ao longo de 20 semanas – as primeiras 50 foram dadas na
sexta-feira (9), dois dias antes de o embaixador da Arábia Saudita
marchar com outros defensores da liberdade de expressão.
Confira
abaixo a lista de Wickham, apontando 21 líderes mundiais e fervorosos
defensores da liberdade de imprensa e expressão:
1) Rei Abdullah,
da Jordânia,
que no ano passado sentenciou um jornalista palestino a 15 anos na prisão com trabalhos
forçados
2) Primeiro-Ministro
Davutoglu, da Turquia,
que prende mais
jornalistas do que qualquer outro país no mundo
3) Primeiro-Ministro
Netanyahu, de Israel,
cujas forças [armadas] mataram 7 jornalistas em Gaza no ano passado (ficando atrás apenas da
Síria)
4) Ministro
das Relações Exteriores Shoukry, do Egito,
que além de prender jornalistas da Al Jazeera, deteve também o jornalista Shawkan por cerca de 500 dias
5) Ministro
das Relações Exteriores Lavrov, da Rússia,
que no ano passado prendeu um jornalista por “insultar um funcionário do governo”
6) Ministro
das Relações Exteriores Lamamra, da Argélia,
que prendeu o jornalista Abdessami Abdelhai por 15 meses sem julgamento
7) Ministro
das Relações Exteriores dos Emirados Árabes,
que em 2013, manteve um jornalista incomunicável durante um mês
8) Primeiro-Ministro
Jomaa, da Tunísia,
que recentemente prendeu o blogueiro Yassine Ayan por 3 anos, por ter “difamado o
exército”
9) Os
primeiro-ministros da Georgia e Bulgária,
ambos países que têm um histórico deatacar e bater em jornalistas
10) O
Procurador-Geral dos EUA,
cuja polícia em Ferguson recentemente deteve e agrediu repórteres do Washington Post
11) Primeiro-Ministro
Samaras, da Grécia,
cuja tropa de choque agrediu e feriu dois jornalistas em um protesto em junho
do ano passado
12) Secretário-Geral
da Otan,
que ainda precisa ser responsabilizada pelo bombardeio e assassinato deliberado de 16 jornalistas sérvios em 1999
13) Presidente
Keita, do Mali,
onde jornalistas são expulsos por cobrirem abusos aos direitos humanos
14) Ministro
das Relações Exteriores de Bahrein, segundo maior país que prende jornalistas no mundo (e também os torturam)
15) Xeique
Mohamed Ben Hamad Ben Khalifa Al Thani, do Qatar,
que condenou um homem por 15 anos por escrever o “Poema do Jasmim” - que criticava os governos
do Golfo Pérsico no pós-Primavera Árabe
16) Presidente
Mahmoud Abbas, da Autoridade Palestina,
que prendeu diversos jornalistas em 2013 por “insultá-lo” no Facebook
17) Primeiro-Ministro
Cerar, da Eslovênia,
que condenou um blogueiro a seis meses de prisão por “difamação”,
em 2013
18) Primeiro-Ministro
Enda Kenny, da Irlanda, onde “blasfêmia” é considerado um crime
19) Primeiro-Ministro
Kopacz, da Polônia,
que invadiu a redação de uma revista para apreender gravações que
comprometiam o partido do governo
20) Primeiro-Ministro
Cameron, do Reino Unido,
onde as autoridades ordenaram a destruição dos documentos de Edward Snowden
obtidos pelo The Guardian e
os ameaçaram de processo
21) Embaixador
da Arábia Saudita na França. Os sauditas açoitado publicamente o blogueiro Raif Badawi por “insultar
o islã”
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