Misérias da elite brasileira
por Mauri Cruz, em Carta Capital
Há um objetivo oculto nas ações dos que tentam “impeachment”: acabar com Lava Jato e “passar a régua” nos casos de corrupção empresarial, brandindo um bode expiatório
Para quem acompanha os noticiários, lê
por entre as linhas ou escuta por detrás das falas, está mais do que evidente
que o verdadeiro objetivo daqueles que querem o impedimento da Presidenta da
República é acabar com a Operação Lava-Jato e as demais investigações contra a
corrupção no Brasil. Isto porque, nestas operações, a lista de políticos dos
partidos tradicionais, entre eles, o PP e o próprio PMDB é extensa e envolve
nomes de peso que atualmente estão no centro do poder. As demais investigações
como, por exemplo, a Operação Zelotes e o Trensalão de São Paulo, pegam em
cheio os principais dirigentes do PSDB e seus aliados, dentre eles a Rede Globo
e afiliadas, inclusive a própria RBS.
Isso
significa que, se os arautos da ética conseguirem seu intento de derrubar a
Presidenta do Brasil, ato contínuo irão encerrar as investigações colocando
tudo para debaixo do tapete. Aliás, assim já estão fazendo com o denominado
“Mensalão de Minas”, que, para guardar simetria com o outro, deveria ser
chamado de Mensalão do PSDB. Enquanto o Zé Dirceu, estando preso, é preso
novamente em horário nobre, os réus daquele crime sequer estão sendo
incomodados pelo Poder Judiciário e, como sabemos, serão “inocentados” por
decurso de prazo.
No
entanto, depois de tentarem colocar o país mobilizado contra a corrupção, única
forma de pararem com as investigações antes que elas resultem em sua própria
prisão, os detentores do poder precisam depor uma Presidenta legitimamente
eleita, oferecendo sua cabeça como prêmio ao país. Sem entregar à “opinião
pública” um agente político da estatura da Presidenta Dilma não será possível
“aplacar a ira” criada contra a política e os políticos nos últimos anos pela
própria mídia corporativa.
Lembrem-se
que isto assim já ocorreu. Em 1992, passado o impedimento do Presidente
Fernando Collor, praticamente todos os seus aliados continuaram nos mesmos
postos fazendo o que faziam antes. O próprio Collor foi “absolvido” pelo
Supremo Tribunal de Justiça por falta de provas. E, frente a este absurdo
jurídico, a mídia corporativa nada disse. Nada bradou. Nada questionou.
Evidente está que a cruzada pela ética na política, àquela época como agora,
serve apenas como fachada para manter tudo como estava.
A
intenção é explícita. Criar um clima contra a corrupção que seja capaz de
justificar a deposição da Presidenta, para, a partir daí, fazer justamente o
contrário: manter a roubalheira como ela sempre existiu. Por isso, Cunha e seus
aliados tentaram barrar a indicação do Procurador Geral, Rodrigo Janot. A
tarefa dele é não deixar que a lista dos denunciados com foro privilegiado vá
para o fundo das gavetas, lista esta, como já dito, que contém uma extensa
maioria de políticos do PP, PMDB e PSDB. Neste round perderam mais uma. A
Presidenta Dilma não se intimidou: demonstrou que vai até as últimas
consequências e não teme o embate final.
Neste
contexto, o que não consigo entender é como algumas lideranças históricas da
esquerda brasileira caem na cantilena da direita de combate à corrupção. Não se
trata, é óbvio, de defender a prática da corrupção, seja ela qual for e onde
estiver. Mas é evidente que as campanhas nada sinceras em favor da moralidade
pública nada têm a ver com sanar as contas públicas e garantir que os recursos
sejam destinados ao atendimento das necessidades da maioria da população
brasileira. É triste acompanhar militantes de renome fazendo coro aos discursos
falsamente honestos da mídia empresarial. Aqueles que sonegam milhões de reais,
apóiam e sempre apoiaram empresas, empresários e políticos corruptos, assumem a
bandeira da moralidade administrativa somente para ferir de morte quem está
combatendo, verdadeiramente, a corrupção no país.
Soubessem
as pessoas que a política por detrás das mobilizações do dia 16 de agosto não
visam ampliar direitos ou garantir melhores políticas públicas e sociais para
todas e todos, ninguém teria coragem de defender ou aderir a essa falsa
mobilização. Soubessem as pessoas que, caso vença a manobra do impedimento da
Presidenta, os verdadeiros corruptos e corruptores continuarão com o controle
do poder econômico, não iriam aderir a esta triste mobilização.
Por
sua vez, o governo federal precisa sair da defensiva e de tentar, também ele,
compor acordos com o grande capital. Não será assim que consolidará uma
resistência afirmativa do projeto que, apesar dos problemas, vinha se mostrando
vencedor. Como bem diz uma campanha veiculada nas rádios de Porto Alegre:
dinheiro não some, troca de mãos. Os dados demonstram que, como resultado da
pretensa crise econômica, a riqueza do povo brasileiro está saindo da cadeia
produtiva e retornando para as mãos dos bancos e banqueiros de onde, por
iniciativa da própria Presidenta Dilma, tinha sido retirada. Prova disto é a
divulgação do lucro de bilhões de reais anunciada pelos bancos Itaú e Bradesco,
dentre outros.
O
Brasil é um país continental, com uma riqueza ambiental maravilhosa, um povo
trabalhador e solidário que é responsável por uma das maiores economias do
mundo. A luta popular tentou, por séculos, iniciar um projeto verdadeiramente
democrático e popular. Desde 2002, deu início a uma longa e lenta transição
democrática que, infelizmente, a miséria política e intelectual da elite
brasileira não enxerga porque nunca sonhou com um Brasil verdadeiramente
independente, livre e soberano. Espero que o povo brasileiro, através de suas
organizações e movimentos sociais, saiba pôr-se de pé e impedir, com seu sangue
se preciso, qualquer tentativa de retrocesso ou rendição. Desta vez, não
passarão.
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