Dilma e a esperança
Semanas turvas. Na campanha final, Lula terá de novo um papel determinante. A união faz a força
Editorial da Carta Capital
CartaCapital apoia a reeleição porque sabe que o PSDB é a direita e uma vitória tucana significaria o retorno ao passado
A mídia nativa encontra à última hora o novo salvador da pátria.
Aécio Neves atropela Marina Silva na reta final do primeiro turno da eleição
presidencial e consegue o segundo lugar com uma porcentagem de votos que supera
as expectativas. O tucanato está em festa, e tem boas razões para tanto, a se
considerar a rápida ascensão do seu candidato. Agora na aposta da continuidade
do desempenho em elevação.
O
verdadeiro partido de oposição, a saber a imponente estrutura midiática,
exulta, na certeza de que sua atuação foi decisiva em alguns estados, sobretudo
em São Paulo. De fato, este primeiro turno confirma a terra bandeirante como a
mais reacionária do País. São Paulo não somente reelege um governador
incompetente como Geraldo Alckmin, irresponsável até em vários casos, além de
envolvido em escândalos, mas também confere a Aécio Neves uma vantagem abnorme
em relação a Dilma Rousseff.
Segundo aspecto do pleito
a ser acentuado: a clamorosa falha das pesquisas em vários estados. Em São
Paulo, a surpresa está no resultado alcançado pelo candidato do PT, Alexandre
Padilha, muito acima da porcentagem atribuída pelas pesquisas, tão baixa de fio
a pavio, a ponto de levar a Globo a se desinteressar, com indisfarçável
alegria, da cobertura da sua campanha.
Notável o erro em relação
à Bahia, onde a vitória de Paulo Souto no primeiro turno era garantida por
robusta porcentagem, e onde quem se sagrou governador de saída é o escolhido de
Jaques Wagner, Rui Costa. E no Rio Grande do Sul quem trafegou em terceiro
lugar desde o início da campanha a governador, Ivo Sartori, do PMDB, vai para o
segundo turno em primeiro lugar. Cabe questionar os institutos: incompetência
ou má-fé? Deslize em proveito da crença guardada a sete chaves, ou falta total
de acuidade?
Algo mais a anotar: o
excelente resultado obtido pela presidenta no Nordeste, a região que soube
entender e aproveitar o êxito das políticas realizadas nos últimos 12 anos
pelos governos de Lula e Dilma. Mais expressivo de todos, o desfecho baiano.
Ali havia motivos para temer o retorno do carlismo, já representado na
prefeitura de Salvador pelo neto de Antonio Carlos. Registra-se o êxito da administração
wagneriana, sem cavalgada das Valquírias.
Na visão óbvia das
próximas três semanas, a nos separar do segundo turno da eleição presidencial,
não é árduo prever uma disputa ao último sangue, com a participação maciça da
mídia alinhada compactamente às costas do tucanato e, do outro, de Lula,
novamente em ação, talvez mais do que nunca.
Cabe comparar a situação de hoje com aquela de quatro anos
atrás. Dilma cai cerca de 5 pontos porcentuais, enquanto
Aécio melhora em cerca de 1 ponto a posição do então candidato José Serra.
Marina Silva também cresceu cerca de 2. Ou seja, as condições não estão muito
longe daquelas de 2010. E, por outra, repete-se a polarização tradicional nas
últimas duas décadas. E esta é a hora de reafirmar o apoio de CartaCapital à presidenta.
As nossas motivações se
reforçam nesta fase do confronto. Ao se inaugurar a campanha, previa neste
espaço que tanto Aécio quanto Marina seriam inevitavelmente arrastados para a
direita ao surfar a onda midiática. Neste gênero de entrega
ao chamado das sereias os tucanos já mostraram largamente a sua escassa vocação
odisseica. Foi o que se deu com Fernando Henrique Cardoso na Presidência e com
José Serra em diversas oportunidades. Ambos tornaram-se empedernidos reacionários,
a exibir toda a inconsistência ideológica da chamada esquerda brasileira. Ou,
pelo menos, de certa vertente dita esquerdista.
A esta altura, Aécio já
disse a que veio. Em um ponto, certamente, a orientação fica definida. Confesso
meu pavor diante da perspectiva de ter Arminio Fraga como ministro da Fazenda,
destemido arauto do neoliberalismo, não menos de FHC e seu governo. Apavorante
retorno ao passado, para falar alto e bom som, igual a um editorial do Estadão. Temo, obviamente, que a
ameaça formulada então, a privatização da Petrobras, se concretize caso Aécio
chegue ao trono. E me pergunto o que será de uma política exterior que
desatrelou os interesses do Brasil daqueles dos Estados Unidos, ora viva.
E que sobraria de uma
política social que melhorou a vida de boa parte de condenados à miséria e
investiu bastante em educação? Avanços insuficientes, é verdade factual, mas
importantes no País da casa-grande e da senzala. E esta continua a ser a
questão central. Como há de ser para quem se empenha a favor da igualdade.
Apoiamos Dilma porque ela representa esperança de igualdade, e CartaCapital não arrefece na expectativa de quem dela se aproxime cada vez
mais. O estadista almejado. Dono, por exemplo, de sabedoria e coragem
para coibir os desmandos midiáticos, a começar pela hegemonia da Globo, na
terra do futebol onde o próprio, e chego aos limites do cogitável, é disputado
nos horários que ela decide. Este pode ser tomado como exemplo miúdo, mas não
é.
E se falamos de esporte,
regras hão de ser estabelecidas para impedir de vez a farra dos cartolas, de
forma a devolver dignidade ao esporte das multidões. É deste gênero de atuação
que o povo precisa, inserida no quadro de uma política social voltada às
demandas mais profundas da alma nacional.
Não precisamos, por
exemplo, de uma dita Comissão da Verdade que se apavora diante da verdade.
Factual, está claro. Precisamos, isto sim, liquidar de vez uma lei da anistia
imposta pela ditadura encerrada há quase 30 anos. Atitudes deste porte, talvez
menor na aparência, provariam de fato uma ousadia nunca dantes navegada, a
indicar um governo capaz de dar início à demolição da casa-grande e da senzala.
Conduzida em paz, em sintonia, porém, com o nosso tempo.
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