Por que nenhum jornalista quis ouvir a advogada da Odebrecht?
Desprezada
Se um dia a posteridade quiser aferir a miséria do
jornalismo brasileiro nestes tempos, bastará consultar o desabafo da advogada
Dora Cavalcanti, que defende a Odebrecht no caso Petrobras.
Num artigo publicado na Folha, ela
contou que nem um único jornalista a procurou para conversar sobre o encontro
que ela teve com o ministro José Cardozo no dia 5 de fevereiro.
Repito: nem um. Zero.
Que havia interesse jornalístico na
reunião é evidente. É só ver, primeiro, o tom apocalíptico com que a mídia a
noticiou. E depois a reação histérica e despropositada de Joaquim Barbosa e do
juiz Sérgio Moro.
Por que, então, ninguém foi atrás de
uma pessoa que participou do encontro?
É que a mídia brasileira não quer
ouvir ninguém que traga pontos de vista diferentes dos seus em relação ao caso
Petrobras.
Não há espaço para vozes divergentes.
Não existe pluralidade. A grande mídia tirou de sua agenda opiniões
discordantes.
Ajudar o leitor a entender a
complexidade de muitas situações é uma das funções mais sagradas da imprensa.
A nossa abdicou disso há muitos anos.
Se você mostra uma realidade parcial para o leitor é mais fácil manipulá-lo.
Esta a lógica sinistra da mídia
brasileira.
Dora tens bons pontos.
A questão dos vazamentos seletivos é
um deles. Em outros países, pondera ela, isso é inaceitável.
No Brasil, isso virou uma rotina – sem
que se veja nenhum empenho em Moro em tentar pôr fim a elas.
Os vazamentos seletivos, e este é
outro bom ponto de Dora, atrapalham consideravelmente o direito de defesa dos
réus.
Em essência, é uma coisa injusta.
Como teria se comportado Moro se os
vazamentos não alcançassem os suspeitos de sempre?
Bem, é uma hipótese inverossível: a
imprensa não publicaria nada.
A advogada Dora Cavalcanti trouxe
alguma luz ao caso Lava Jato com seu depoimento.
Moro e Barbosa, em compensação,
produziram sombras.
Com sua agressão a Cardozo, Moro
deixou claro, talvez involuntariamente, que está longe de personificar o ideal
do juiz equidistante e imparcial.
É uma má notícia para a sociedade. Não
à toa, a imprensa deu a ele o mesmo ar heroico que no Mensalão fora de Barbosa.
Os dois – Barbosa antes e Moro hoje –
simbolizam o conservadorismo na Justiça nacional.
Barbosa, no Mensalão, fez horrores sem
virtualmente nenhum obstáculo.
É um alerta.
Moro não pode ter o mesmo caminho
fácil agora que foi concedido no passado a Barbosa. Seus métodos têm que
ser desafiados quando necessário.
Foi o que a advogada Dora Cavalcanti
fez.
A despeito do que a Justiça decida
sobre o papel da Odebrecht na história, o gesto de sua advogada merece
aplausos. De pé.
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