Da Justiça, o mínimo que se espera é bom senso. Por Mauro Santayana
Quando suas decisões afetam não apenas
o réu e sua vítima, mas centenas, milhares de cidadãos, o promotor deve acusar
e o juiz, julgar, com a mente e o coração voltados para o que ocorrerá, in consequentia.
Nos últimos anos, a nação tem tido, na área de obras
públicas, bilhões de reais em prejuízo. E isso não apenas devido a falhas de
gestão – que, com a exceção dos Tribunais de Contas, não devem ser analisadas
pelo Judiciário – ou de casos de corrupção, alguns com mais de 20 anos.
Houve também a paralisação – a caneta – de grandes obras de
infraestrutura. Belo Monte, a terceira maior hidrelétrica do mundo, em
construção na Amazônia em um momento que o país precisa desesperadamente de
energia, teve suas obras judicialmente suspensas por dezenas de vezes, o que
também contribuiu para que se somassem meses, anos de atraso ao seu prazo de
entrega; e também para a multiplicação de seus custos.
O
mesmo ocorreu com Teles Pires e Santo Antônio, com a refinaria Abreu e Lima e
com a transposição do São Francisco. Em todos esses empreendimentos foram
encontrados problemas de algum tipo, mas justamente por isso, é preciso que o
Ministério Público e o Judiciário busquem outro meio de sanar eventuais falhas
e punir irregularidades, que não seja, a priori, a imediata paralisação
das obras. Afinal, ainda é melhor obras com problemas, que podem ser
eventualmente corrigidos, do que nenhum projeto ou iniciativa desse porte, em
setores em que o país esteve praticamente abandonado durante tantos anos.
Uma
das soluções, para se evitar esse tipo de atitude drástica, poderia ser a de
que se nomeasse interventores que pudessem investigar irregularidades e
fiscalizar, in loco, em cada obra, o cumprimento das determinações
judiciais.
Declarações bombásticas e precipitadas também não ajudam,
quando se trata de projetos essenciais para o desenvolvimento do país nos
próximos anos.
No contexto da Operação Lava Jato, centenas de milhares de
trabalhadores e milhares de empresas já estão perdendo seus empregos e arriscando-se
a ir à falência, porque o Ministério Público, no lugar de separar o joio do
trigo, com foco na punição dos corruptos e na recuperação do dinheiro – e de
estancar a extensão das consequências negativas do assalto à Petrobras para o
restante da população – age como se preferisse maximizá-las, anunciando, ainda
antes do término das investigações em curso, a intenção de impor multas
punitivas bilionárias às companhias envolvidas, da ordem de dez vezes o
prejuízo efetivamente comprovado.
Outro aspecto a considerar é a interferência indevida, em
esferas da administração pública que não são da competência do MP, como foi o
pedido de paralisação, no mês passado, das obras de ciclovias que estão em
execução pela prefeitura de São Paulo.
Não cabe ao Ministério Público, em princípio, julgar,
tecnicamente, questões viárias. E menos ainda, limitar o debate e a busca de
consenso, em âmbito que envolve a qualidade de vida de metrópoles como a
capital paulista, uma das maiores do mundo.
A não ser que haja uma mudança constitucional que faça com
que venham a ser escolhidos por meio das urnas – e mesmo que viesse a ocorrer
isso – é preciso que o Ministério Público e o Judiciário tenham especial
cuidado para que alguns de seus membros não passem a acreditar – e a agir – como
se tivessem, com base na meritocracia, sido ungidos por Deus para tutelar os
outros poderes, e, principalmente, o povo.
Aos juízes e ao Ministério Público não cabe interferir, de
moto próprio, nem tentar substituir o Legislativo ou o Executivo, na administração
da União, dos Estados e municípios, que devem recorrer ao Supremo Tribunal
Federal sempre que isso ocorra, assim como cabe ao STF coibir, com base na
Constituição, esses eventuais excessos.
Em uma democracia, todo o poder emana do povo.
É ele que comanda. É ele que, em última instância, executa.
É ele que, indiretamente, legisla. É ele que, a cada dois anos, julga, por meio
do processo eleitoral, segundo o rito político. A sua sentença é o voto.
O eleitor é o Estado. E o juiz supremo.
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