Ricardo Mello: “Impeachment para Gilmar Mendes”
Fiel Bulldog Inglês empresta muito a contra gosto seu focinho para mascarar Gilmar Mendes
De Ricardo Mello, na Folha:
No tiroteio generalizado em que se transformou a agenda
política, é difícil identificar consensos. Assim funciona o jogo democrático
formal. Até o momento em que uma maioria se estabeleça, seja nas urnas, seja em
tribunais.
O Brasil assiste a um espetáculo digno das repúblicas
bananeiras de outrora. Há mais de um ano, por 6 a 1, o Supremo Tribunal Federal
decidiu proibir o financiamento privado de campanhas. Rendeu-se ao óbvio:
grandes empresas despejam milhões e milhões em siglas investindo no futuro
–delas, é claro.
Uma engrenagem sem fim, pouco importa o governo. Os números
de doações eleitorais são eloquentes quanto à “democratização” deste
financiamento. Tem para todo mundo, do PT ao PSDB, do PMDB ao PP, e assim por
diante. Do Metrô de SP à Petrobras, de Furnas à Telemar, de Marcos Valério a
Eduardo Azeredo.
Sob a pressão legítima contra a corrupção
institucionalizada, o STF resolveu tomar alguma providência. Ninguém garante,
longe disso, que a limitação da promiscuidade entre empresas e candidatos possa
ser estancada com uma canetada. Mas inibe, e a redução de danos é o máximo que
um sistema como o nosso poderia almejar no momento.
Mas, pelo jeito, nem disso estamos perto. O ministro Gilmar
Mendes atenta abertamente contra a Constituição e o regimento do STF e decide,
ditatorialmente, que pouco interessa a voz da maioria. Pede vistas de uma
votação já decidida, faz campanha pública contra os pares e impede a aplicação
de uma sentença praticamente julgada. A democracia formal reza que a cada um,
cabe um voto. Na “gilmarocracia”, a cada um, ele, cabem todos os votos.
O espantoso é observar o silêncio obsequioso do próprio
Supremo, do Congresso, das instituições da sociedade civil em geral. Rápido no
gatilho quando se trata de conceder habeas corpus para banqueiros graúdos,
Gilmar se permite o desfrute de determinar o que pode ou não ser votado no
tribunal: “Não podemos falar em financiamento público ou privado sem saber qual
é o modelo eleitoral […] Isso não é competência do Supremo, é do Congresso.” E
ainda humilha os colegas: “O tribunal não servirá de nada se não tiver um juiz
que tenha coragem de dar um habeas corpus, de pedir vista.”
A história está cheia de exemplos de megalomaníacos. Idi
Amin Dada, o ditador de Uganda, adorava se fantasiar de escocês enquanto
massacrava opositores. Nero tocou fogo em Roma. Dispensável citar aquele
austríaco tristemente famoso e os nossos generais-presidentes.
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