Filme chinês traz trama sobre paranoia e vigilância em tempos de modernidade
Protagonista do filme, Qiuming trabalha como freelancer em uma agência de cartografia em Nanjing
Entre as
muitas contradições do chamado “capitalismo de Estado” adotado pela China, está
o fato de o país asiático - que investe cada vez mais em alta tecnologia -
censurar diversas páginas da internet. Esta característica acentua no local uma
discussão que é hoje global: em tempos de redes sociais e aplicativos com
geolocalização, como definir os limites entre a praticidade fornecida por estes
serviços e a invasão de privacidade muitas vezes resultante deles? Tal questão
é um dos cernes do filme chinês Rua
Secreta, que entrou em
cartaz em São Paulo na última quinta-feira (03/09).
No longa-metragem de
estreia da diretora Vivian Qu, o jovem Qiuming (Lu Yulai) trabalha comotrainee em uma empresa de cartografia digital
da cidade de Nanjing. Durante uma de suas jornadas, ele descobre uma rua sem
saída que não está documentada nos mapas do município e que desaparece até
mesmo do mapa que ele acabara de atualizar. Com vontade de entender este
mistério, e também atraído por uma mulher que cruza seu caminho, o protagonista
passa a rondar o local em busca de respostas.
A
primeira metade do filme é usada para pontuar algumas de suas preocupações. A
presença temática da vigilância e do voyeurismo de nossos tempos pode ser vista na
cena inaugural, quando o equipamento cartográfico utilizado por Qiuming ganha
função de câmera e é usado pelo protagonista para seguir os passos de Lifen (He
Wenchao), a moça com quem ele virá a se relacionar; já a revelação de um
segundo emprego do protagonista, como instalador de câmeras ilegais, surge como
prenúncio irônico a respeito do desenrolar da narrativa.
O grande mérito desta
parte do trabalho é o de conseguir conduzir a atenção do espectador para as
inquietações do protagonista, ao mesmo tempo em que faz observações precisas
sobre problemas chineses. Em uma das cenas, por exemplo, os cartógrafos são
perseguidos ao serem confundidos com funcionários de uma empreiteira que quer
colocar fim a uma ocupação habitacional.
Entretanto,
quando tais sutilezas dão lugar à literalidade exigida pela bem feita
construção do mistério - no momento em que os responsáveis pela opressão do
protagonista são nomeados -, o filme apresenta uma queda perceptível graças ao
insuficiente desenvolvimento do roteiro, que trilha caminho genérico e não
sustenta o seu promissor início.
Ressalvas
à parte, o desfecho de Rua Secreta - que faz
lembrar o de A Conversação, clássico de Francis Ford
Coppola - conclui um trabalho interessante sobre como o controle do indivíduo e
a paranoia andam juntos em tempos de Google Maps.
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