O POVO IRÁ ÀS RUAS HOJE, QUARTA 16, POIS O QUE ESTÁ EM JOGO É A NOSSA DEMOCRACIA
A
luta pela defesa da democracia encontra-se num momento especial, e é bom
reconhecer a importância de comparecer aos protestos de hoje.
Após
um ano de massacre contínuo, iniciado exatamente no dia seguinte da vitória de
Dilma Rousseff em outubro de 2014, por forças inconformadas diante da quarta
derrota consecutiva nas urnas, a consciência democrática da maioria dos
brasileiros cobra seus direitos.
Crescem
as manifestações de rua, multiplicam-se manifestos de juristas, de
intelectuais, de psicanalistas. As mais recentes envolvem empresários do setor
produtivo, deixando claro que aquele setor que cria empregos não pode enxergar
benefício algum num ataque ao regime democrático, que produz efeitos ruinosos e
duradouros também sobre a economia.
As
manifestações mais antigas envolvem a juventude e os sindicatos de
trabalhadores e é sempre bom lembrar que a Força Sindical, de onde saiu uma das
estrelas mais descaradas do golpe, desde o início fez a opção democrática, pelo
terreno onde se encontram os assalariados e suas lideranças reais.
Os
trabalhadores não estão satisfeitos com o país de hoje. Mesmo que os
adversários do governo tentem apresentar a situação com exagero, a verdade é
que o desemprego cresce, o salário perde valor. Direitos foram questionados.
Eles pedem mudanças, legítimas. Mas sabem onde estão seus interesses e por isso
defendem a democracia. Sem ela, a maioria do povo sempre terá mais dificuldade
para se defender.
Nos
últimos dias, uma resistência inicialmente desorganizada, intuitiva até, obteve
uma vitória decisiva, ao impedir a sequência de uma articulação que pretendia
realizar um golpe de Estado num modelo paraguaio, programada para ocorrer
através da sinistra Comissão Especial para encaminhar o impeachment através do
Congresso.
O
papel de Eduardo Cunha como comandante em chefe do golpe foi colocado em
questão pelos próprios aliados, que até ontem acomodavam as suas contas na
Suíça em torno daquilo que, de seu ponto de vista, representava o mal maior.
O
país assistiu, no caso Cunha, a uma versão política de um velho conto de fadas.
O feitiço (a utilização demagógica das denúncias de caráter moral para receber
benefícios de natureza política) voltou-se contra os feiticeiros do
impeachment, transformando o Fora Cunha numa questão inadiável.
A
indignação popular, expressa inicialmente na denúncia corajosa de um punhado de
parlamentares que exigiram seu afastamento, finalmente desencalacrada pelo
apertado placar de 11 votos a 9 no Conselho de Ética, impediu que Eduardo Cunha
seguisse utilizando um poder de Estado, o próprio Legislativo, como um aparelho
para articulações e movimentos contra as garantias democráticas.
No
centro intelectual do golpe, que alimenta com informações e denúncias
seletivas, os principais grupos de mídia entenderam que Cunha deve ser
afastado, deram sinal verde para que seja investigado. Cabe registrar a delicadeza
da situação que pode ser criada a partir de negociações para uma substituição
neste momento, em plena batalha, que envolve o personagem que ocupava o centro
de gravidade das operações diretas contra o governo. Não só disparou ataques
permanentes contra o governo a partir de uma pauta conservadora imposta ao
Congresso desde o início do ano. Como denunciou Sibá Machado, líder do PT na
Câmara, Cunha atuou até como consultor de pedidos de impeachment, recomendando
que fizessem a lição de casa, para evitar o vexame de uma derrota sem apelação
num primeiro teste de constitucionalidade.
Apesar
do enfraquecimento dos adversários da democracia, a guerra está longe de ter
sido vencida, muito longe, é importante lembrar. Uma situação de impasse e
disputa contínua.
A
divisão reflete a dificuldade política dos golpistas para construir uma força
de consenso na sociedade, como ocorreu, em outra circunstância, nas
investigações sobre Fernando Collor.
Com
base em crimes de responsabilidade, demonstrados com fartura, não foi difícil
construir em 1992 uma unanimidade política pela investigação do presidente. Era
uma solução democrática, fato que uniu as principais forças do espectro
político, sem exceção. Além do Partido dos Trabalhadores, do PMDB, de
lideranças do PSDB como Mário Covas, o próprio Fernando Henrique Cardoso, que
foi tentado a assumir um ministério de Collor no início do governo, pediu a OAB
que se engajasse na denúncia contra o presidente.
A
compreensão de que os adversários de Dilma não conseguem apontar um crime
responsabilidade contra ela muda o caráter do debate. Lembra, para pessoas que
guardam a memória da luta pela democracia, que não se pode pisar nas regras
constitucionais como se estivessem escritas num papelzinho sujo na calçada.
Essa é a questão irrespondível, a linha divisória.
Num
país onde os meios de comunicação têm uma memória notavelmente fraca, é
constrangedor lembrar a lista de notáveis lideranças do impeachment que, até há
pouco, faziam questão de reconhecer que a honestidade pessoal da presidente não
pode ser colocada em dúvida. O que mudou?
Mudou
a visão sobre as denúncias contra o governo, que podem apontar para mazelas
variadas -- mas são um instrumento nulo para demonstrar a culpa da presidente.
O
dia de hoje destina-se à democracia, que deve manter seu curso e, eleita por
mais de 54,5 milhões de votos, a presidente deve ter o direito assegurado de
conduzir o governo até o final do mandato.
Ao
contrário de um processo de impeachment realizado dentro da lei, uma investida
de caráter golpista produz traumas e retrocessos. Além de gerar profundas
incertezas sobre o funcionamento das instituições, com um efeito óbvio sobre a
vida de cada um dos brasileiros não apenas no plano da política, mas também da
economia, da cultura, uma vitória conquistada na ilegalidade é um estímulo a
arrogância dos vencedores, ao desrespeito sem consideração pelos direitos dos
vencidos.
Guarda
toda a truculência de um golpe, sua brutalidade, por mais que se tente
envernizar a realidade com juras de amor pela democracia.
É
por isso que a Constituição prevê a alternância no poder -- pelo voto popular.
A última vez que elas foram rompidas, em 1964, um país que deveria aguardar até
1965 para realizar eleições presidenciais foi submetido a uma ditadura de 21
anos. Este é o debate hoje.
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